O próximo Presidente do Brasil pode ser um pesadelo para a Amazônia (e o resto do mundo)

Jair Bolsonaro diz que há muita “riqueza debaixo dela” para deixar a floresta tropical em paz.

Jair Bolsonaro, em coletiva de imprensa no Rio de Janeiro, outubro de 2018

Credit: Antonio Lacerda/Alamy Stock Photo

Os brasileiros acabam de eleger um hipernacionalista iliberal, Jair Bolsonaro, como seu próximo presidente. O ex-oficial militar de 63 anos e legislador de sete mandatos não conseguiu apenas uma vitória; ele ganhou de maneira bastante decisiva, com 55% dos votos, refletindo um nível amplo e inquietante de apoio entre o eleitorado. Durante sua campanha, Bolsonaro disse inconscientemente coisas horríveis sobre mulheres, negros e indígenas, e a comunidade LGBTQ; ele também pediu a prisão de seus inimigos políticos e expressou sua profunda admiração pela ditadura da era da Guerra Fria no Brasil, criticando apenas por não ter matado ainda mais dissidentes durante o seu reinado assassino de 21 anos.

Há muitas razões, em outras palavras, para lamentar o surgimento dessa figura divisionista e autoritária na liderança do maior país da América do Sul e da oitava maior economia do mundo. Mas, no topo da lista, está o desejo expresso de Bolsonaro de abrir ainda mais a floresta amazônica ao agronegócio. Tal medida exacerbarar o desmatamento da maior floresta tropical do mundo, potencialmente deslocando mais de um milhão de indígenas e degradando um sumidouro de carbono globalmente crucial.

“Onde há terra indígena, há riqueza sob ela”, disse Bolsonaro durante sua campanha, prometendo ainda que “não haverá um centímetro quadrado demarcado como uma reserva indígena” quando ele se tornar presidente. Tais declarações parecem ainda mais ameaçadoras no contexto de seus planos declarados de descontinuar o Ministério do Meio Ambiente de seu país como uma agência autônoma e, em vez disso, torná-lo um subconjunto do Ministério da Agricultura do Brasil, que é intimamente ligado ao setor de agricultura industrial do país.

“Salve a floresta tropical” tem sido um slogan do movimento ambientalista mundial há tantas décadas que é possível ignorar o que, exatamente, está em jogo aqui. Cobrindo mais 518 milhões de hectares, o ecossistema da floresta tropical conhecida como Amazônia se estende por nove países da América do Sul, apesar de 60% estar dentro das fronteiras do Brasil. A floresta tropical é uma maravilha da biodiversidade animal, habitat (na última contagem) de cerca de 3.000 espécies de peixes, 1.300 aves, 427 mamíferos, 400 anfíbios e 378 répteis.

E, depois há a questão globalmente significativa de sua diversidade de plantas. A floresta amazônica abriga mais de 40.000 tipos de plantas e cerca de 390 bilhões de árvores individuais, representando 16.000 espécies diferentes. Toda essa vegetação, espalhada por todos esses milhões de hectares, faz da Amazônia um dos maiores sumidouros de carbono e provedores de oxigênio do planeta, e é por isso que muitas pessoas se referem à Amazônia como os “pulmões do planeta”.

Mas o desmatamento cobra seu preço. A Amazônia diminuiu de tamanho em cerca de 17% no último meio século. A pecuária, em particular, tem impulsionado o fenômeno, respondendo por 80%, enquanto a agricultura é responsável pela maior parte do restante. Depois de fazer progressos reais na frente de conservação a partir de 2005, o Brasil começou a perder terreno, literal e figurativamente, apenas alguns anos atrás. Somente em um período recente de 12 meses, de agosto de 2015 a julho de 2016, mais de 777 mil hectares de floresta desapareceram.

O Jacu-cigano ou Ciganas fotografadas nas florestas do Rio Grande do Sul

Em outras palavras, o Brasil está numa encruzilhada quando se trata de desmatamento. Mas Bolsonaro deixou bem claro qual caminho ele está escolhendo, e sua decisão deixa muitos brasileiros preocupados. Em um tweet recente, Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente do país, expressou seu temor de que o Brasil esteja “entrando em um momento trágico em que a proteção ambiental equivale a nada. O governo Bolsonaro nem sequer começou e o retrocesso já é incalculável”.

O resto do mundo deveria estar preocupado também. Uma equipe internacional de cientistas estima que a implementação das políticas de Bolsonaro poderia resultar em uma perda anual de 2.600 milhões de hectares de floresta tropical, “um número semelhante às taxas de desmatamento medidas no início dos anos 2000 e um aumento de 268% em relação a 2017”. O desmatamento nesse nível não seria apenas um problema local. O desmatamento poderia levar a um aumento de 13,1 gigatoneladas de dióxido de carbono equivalente entre 2021 e 2030. Essa quantidade, segundo os cientistas, representaria até um quinto do restante do orçamento de carbono “livre” do mundo para evitar que a atmosfera esquentasse mais de 1,5 grau Celsius, uma meta que está recebendo muita atenção ultimamente, após o mais recente (e mais preocupante) relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas.

Escrevendo na New Republic, a jornalista ambiental Emily Atkin enquadra desta maneira: A presidência de Bolsonaro “ameaça mais do que apenas a quarta maior democracia do mundo. A habitabilidade de todo o planeta está em jogo”. A pressão de outros líderes mundiais provavelmente se mostrará inútil; como o presidente Donald Trump, a quem ele admira muito, Bolsonaro é o tipo de nacionalista a quem a desonra internacional é usada, perversamente, como um distintivo de honra.

Mas ainda há esperança. Eduardo Viola, professor de relações internacionais da Universidade de Brasília e coautor do livro Brasil e Mudança Climática, acredita que as pressões do mercado podem finalmente alcançar o que a pressão política internacional não consegue. Ele disse recentemente à revista National Geographic que lavradores e fazendeiros brasileiros definitivamente não querem que seus produtos (principalmente carne bovina e soja) sejam automaticamente vinculados à mente do público com a destruição da maior floresta tropical do mundo. Em suas palavras, eles “entendem que uma imagem negativa do Brasil em relação à Amazônia e às mudanças climáticas prejudicará as exportações brasileiras”.

Se é verdade que Bolsonaro e seus apoiadores da Big Ag brasileira não estão inclinados a ouvir ninguém além de consumidores, talvez seja hora de pensar em boicotar produtos agrícolas brasileiros em escala internacional. Funcionou quando os amantes de peixe repercutiram sobre o robalo chileno em perigo de extinção. Se as piores previsões sobre o novo presidente do Brasil se tornarem realidade, uma campanha do tipo “Pare com o Bife brasileiro” poderá ser lançada em breve?


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